Dentro de um
bauzinho cabe uma vida inteira! Ela pensou ao abrir aquele baú tão pequeno.
Tinha muitos papéis, algumas fotos, embrulhos de bombom, guardanapos escritos,
um brinco sem par. Dentro de cada objeto uma história anunciada, uma lembrança
que se reascendia na memória.
Quando criança,
a menininha (tão pequena ela era naquela época) viajou para uma praia! Fora a
primeira vez que vira o mar! Quanta emoção! Hoje, ao pegar o palito de picolé
com a data e o local da viagem escritos, pôde até mesmo sentir o cheiro do mar,
ouvir o barulho das ondas batendo nas pedras. Lembrou-se da viagem. A família
dentro do carro. “Já está chegando”? “Falta muito”? Parecia uma eternidade. Que
viagem cansativa! Mas o cansaço sumiu à primeira vez que seu olhar vislumbrou o
mar. Chegando na casa de praia, queria logo colocar o biquíni e sair em
disparada ao encontro do mar. Sua mãe colocou bóias coloridas em seus braços e
besuntou seu rosto e corpo com filtro solar. E lá foi ela, toda feliz desbravar
a praia. Lembrou-se novamente daquele sentimento, quando seus pés tocaram a
areia. Olhou para a água a sua frente. “Quanta água”! Ela Pensou. Sentiu medo,
mas foi caminhando em direção a ela. “Fique no rasinho”! Disse a mãe. E ela foi. Quando seus pés tocaram o mar,
levou seu primeiro capote. Chorou, mas só de manha mesmo. Sentiu pela primeira
vez o gosto salgado do mar. Naquele dia, e também nos outros dez que ficou na
cidade praiana, comeu milho verde, comprou artesanato local, e aprendeu a
soltar pipa com os primos. Aliás, aprendeu também a fazê-las, apesar de não ter
tanta habilidade. Foram inúmeras recordações que aquele palito de picolé lhe
trouxe. “Uma história e tanto”, pensou. E se nós, leitores, fôssemos ler tudo o
que ela se lembrou, seriam folhas e mais folhas de leitura.
Como pode um
simples objeto lembrar-nos de tanta coisa? Revelam tanto de nós! Não só o
objeto em si, mas também o cheiro, a textura, o sabor. Recordam momentos que não
queremos que saiam das nossas mentes, por terem um significado muito especial.
O palito de picolé permite lembrar o primeiro dia de encontro com o mar, o
bilhete no guardanapo faz lembrar aquele menino que paquerava na infância, e
que escreveu um bilhete no guardanapo da cantina. Aquele perfume faz lembrar a amiga mais
compreensiva. Aquela roupa faz lembrar aquela festa na qual dançou até o sol
raiar.
Uma
raposa um dia disse assim ao príncipe de cabelos dourados e cacheados: “Vês, lá
longe, os campos de trigo? Eu não como pão. O trigo para mim não vale nada. Os
campos de trigo não me lembram coisa alguma. E isso é triste! Mas tu tens
cabelos dourados. Então será maravilhoso quando tiveres me cativado. O trigo,
que é dourado, fará com que eu me lembre de ti. E eu amarei o barulho do vento
no trigo”. No livro de Antoine de Saint-Exupéry, a raposa, muito sabiamente,
ainda diz ao pequeno príncipe: “A gente só conhece bem as coisas que cativou”.
Passamos
por tantos lugares e pessoas durante a vida, e, no entanto, existem aqueles
lugares e aquelas pessoas que não passam despercebidos, que nos provocam, que
nos fazem sentir algo diferente, que promovem em nós outras perspectivas de
mundo, que mexem com o nosso olhar, que despertam novas sensações, novas
emoções. Convidam-nos para a vida!
“Cativa-me”,
assim disse a raposa. “Cativa-me”, assim disse também a menina, “e eu guardarei
lembranças suas no meu baú, para a eternidade”.
Lindo!!! Fez surgir em mim a vontade de ter um (a) filho (a), de vê-lo (a) correndo pela praia, descobrindo coisas e mais coisas... Maravilhoso seria!
ResponderExcluir